O conceito de Lean não é nenhuma novidade para o mundo dos empreendedores.
Porém, ele é geralmente aplicado às indústrias, e poucos percebem seu potencial para a realidade de muitos outros negócios — inclusive no setor de saúde!
Neste artigo vamos explicar como essa teoria funciona, além de dar dicas de como aplicar o Lean em clínicas médicas.
A filosofia do Lean
A filosofia da gestão Lean surgiu na manufatura japonesa.
O termo “lean”, que é frequentemente traduzido como “enxuto”, foi usado pela primeira vez por John Krafic em um artigo de 1988, baseado em sua tese de mestrado na Escola de Gestão do MIT, nos EUA.
Essa tese foi feita a partir de suas observações sobre o modo de funcionamento da linha de produção da Toyota.
A ideia central do Lean consiste em otimizar o valor oferecido ao cliente — ou, no seu caso, ao paciente —, ao mesmo tempo em que o desperdício é minimizado.
Em outras palavras, mais valor com menos recursos!
O Lean em clínicas médicas
O primeiro passo para aplicar o Lean em clínicas médicas é identificar onde está o valor, na visão do paciente.
O Institute of Medicine, dos EUA, levanta seis pontos-chave: agilidade, segurança, eficácia, eficiência, justiça e foco no paciente.
O segundo passo, então, é identificar onde estão os desperdícios, ou seja, quais são os procedimentos desnecessários ou simplesmente não-críticos.
Eles geram atrasos e custos adicionais, podendo até mesmo provocar insatisfação nos pacientes — e, portanto, devem ser eliminados para melhorar o fluxo de trabalho em sua clínica.
A filosofia Lean ainda promove a aceitação de que pode ser preciso incorporar mais procedimentos ao cotidiano de trabalho, mas apenas se ele for agregar valor ou reduzir desperdícios.
Ou seja, o Lean vai contra a tendência de adotar mais e mais procedimentos sem qualquer objetivo estratégico, simplesmente para aumentar a complexidade da gestão.
Os principais desperdícios em clínicas
Vamos falar agora sobre os principais desperdícios observados em clínicas de saúde.
Basicamente, podemos identificar três categorias principais de desperdício: de tempo, de recursos humanos e de recursos materiais.
Refletir sobre isso é essencial para a filosofia Lean.
Desperdício de tempo
Sinais: esperas prolongadas para atendimento; atendimentos mais longos do que o necessário devido à desorganização interna; prazos muito longos para retorno ao consultório.
Para evitar o desperdício de tempo, é preciso organizar melhor o fluxo de trabalho da clínica.
Uma sugestão muito simples é o controle do horário de trabalho da equipe médica, a fim de alcançar uma redução de atrasos no início dos horários da manhã e da tarde.
Essa medida também permite que os médicos completem sua agenda dentro do estipulado, evitando a necessidade de horas extras.
É importante, também, agilizar passos antes do atendimento.
Os pacientes podem, por exemplo, passar por uma triagem durante a espera, onde uma enfermeira vai coletar informações que serão repassadas ao médico.
Assim, o médico pode pular essa etapa quando o paciente entrar em sua sala e ir direto para o atendimento propriamente dito.
Finalmente, sabemos que ocorre muito desperdício de tempo quando o paciente precisa agendar um retorno para trazer exames ou fazer acompanhamento com o médico. Em vários casos, o retorno pode levar meses!
Uma solução é deixar sempre alguns intervalos de poucos minutos reservados entre um paciente e outro para o agendamento de retornos, que são tipicamente mais breves.
Se não forem solicitados, esses intervalos podem ser incorporados ao horário regular de atendimento. Outra alternativa é fazer um pré-agendamento do retorno assim que o paciente sair da consulta.
Vale a pena ressaltar que, quando falamos em agilizar o atendimento, é essencial que a qualidade do mesmo não seja prejudicada.
Só podemos agilizar através de uma melhoria da organização: consultando o histórico do paciente antes da consulta, preparando os equipamentos de que o médico poderá precisar e mantendo a sala devidamente organizada.
Em último caso, se a agenda dos médicos não for mais suficiente para atender à demanda de atendimentos, pode ser a hora de contratar mais um membro para o corpo médico da clínica.
Para evitar desperdícios, essa contratação pode ser feita sob um regime diferenciado, em que o novo médico atenda apenas nos dias e horários em que houver maior fluxo de pacientes.
Desperdício de recursos humanos
Sinais: má alocação de assistentes, secretárias ou enfermeiras nas escalas de trabalho; má distribuição de tarefas entre a equipe da clínica.
Muitas vezes, vemos duas ou três secretárias na recepção da clínica, mesmo quando não há muitos pacientes para recepcionar.
Para evitar esse desperdício de recursos humanos, o ideal é reorganizar as escalas de trabalho e redistribuir as responsabilidades.
Por exemplo, em vez de deixar as duas secretárias atendendo na recepção, uma delas pode ficar exclusivamente responsável por essa tarefa enquanto a outra organiza materiais e ajuda os pacientes antes da consulta.
Assim, cada uma poderá se concentrar melhor em suas responsabilidades específicas, o que aumenta a produtividade.
Desperdício de recursos materiais
Sinais: uso pouco otimizado de máquinas devido a erros no processo de agendamento; perda de materiais hospitalares por falta de controle de compras e estocagem.
Pense no seguinte exemplo: uma clínica possui uma máquina de ressonância eletromagnética.
Todos os dias, a clínica agenda oito ressonâncias, sendo quatro de manhã e quatro à tarde. Porém, só realiza seis ou sete, pois sempre há um paciente que desmarca o procedimento. Então, naquele período de quase uma hora, a máquina fica parada e improdutiva.
Se a clínica tivesse um processo de agendamento mais eficiente — por exemplo, com um sistema de lista de espera ou um termo de compromisso — seria possível aproveitar melhor a máquina.
Ela estaria operando oito horas por dia, mais pacientes seriam atendidos e a clínica não perderia em lucratividade.
Outro caso clássico são os materiais desperdiçados porque o prazo de validade expirou, ou por terem sido comprados em quantidades maiores do que o necessário.
Para evitar que isso aconteça, o segredo é um controle integrado de compras e estoque. Todos os materiais retirados do estoque são contabilizados, e nada é comprado até que o estoque atinja o nível mínimo.
Também deve ser feito um controle dos prazos de validade para que, se um item expirar, ele seja imediatamente retirado da prateleira. Assim, pode-se evitar riscos à saúde e à segurança dos pacientes.
Como você pode ver, o controle da agenda e a organização interna da clínica são essenciais a fim de reduzir desperdícios e gerar valor para o paciente — os dois pilares da filosofia Lean.