O avanço da medicina na área de diabetes caminha para o sentido das novas tecnologias, como os novos dispositivos de monitorização glicêmica. Formas de fazer a doença ter menos impacto negativo no dia a dia desses pacientes e tornar o tratamento mais fácil e eficaz.
No entanto, a maioria dos dispositivos, incluindo os novos sistemas de monitorização, ainda dependem das habilidades dos usuários para terem impacto positivo no tratamento. Devendo contribuir para isso o conhecimento do profissional e a orientação ao paciente.
Os novos dispositivos buscam mudar completamente essa dinâmica. Continue a leitura para entender mais!
Como os dispositivos de monitoramento contínuo da glicose funcionam?
Os dispositivos de monitoramento contínuo da glicose (CGM) fazem a leitura da concentração de glicose por meio de um sensor que capta informações do líquido intersticial e podem ser divididos entre os que fazem essa leitura em tempo real (rt-CGM) ou de forma intermitente (is-CGM).
Para deixar clara essa diferença, os dois sensores coletam informações de glicemia capilar continuamente, porém os sensores rt-CGM também transmitem essa informação continuamente, enquanto que o is-CGM depende do usuário para coletar essa informação.
Dependendo de qual sensor usado, essa informação poderá ser transmitida para um leitor, uma bomba de insulina ou um aplicativo de celular, que pode ser o app do software médico do médico responsável.
Além da medida de glicose, podemos ter informação sobre a tendência da glicemia — se está estável ou tende a queda ou elevação — por meio das setas de tendência, o que possibilita intervenções para evitar hipoglicemias ou hiperglicemias.
Os benefícios encontrados com o uso dos dispositivos de CGM incluem redução da hemoglobina glicada e da incidência de hipoglicemia, além de melhorar uma importante métrica que é o tempo no alvo.
O impacto positivo é evidenciado principalmente nos pacientes com diabetes tipo 1 (DM1), mas existem evidências de benefício para uso de CGM em portadores de diabetes tipo 2 (DM2) que usam insulina basal bolus ou apenas basal.
Na gestação, os dispositivos de CGM são recomendados em pacientes portadoras de DM1, com o objetivo de evitar hipoglicemia materna e neonatal, assim como para evitar macrossomia e internação em UTI neonatal.
Deve também ser considerado em pacientes com diabetes gestacional, em uso de insulina, que apresentem grande variabilidade glicêmica ou risco elevado de hipoglicemias.
Porém, recomenda-se que as métricas obtidas pelo CGM complementam mas não substituem a monitorização de glicemia capilar durante a gestação.
Entre os sensores disponíveis atualmente no Brasil, o mais amplamente utilizado é o FreeStyle Libre, uma forma de is-CGM. Existem três versões do Libre, porém no Brasil temos disponível apenas a primeira versão.
O Freestyle Libre 3 foi recentemente aprovado pelo FDA e será uma forma de rt-CGM, com função de alarmes para alertar sobre alterações glicêmicas.
Além do Libre, temos disponíveis sensores da Medtronic, na forma de rt-CGM, associados a um sistema contínuo de infusão de insulina, assim como o ipro2 que é um sistema de monitorização retrospectiva.
Exitem outras opções ainda não regulamentadas pela Anvisa e indisponíveis no Brasil. Veja a seguir quais são elas!
4 novos dispositivos de monitorização glicêmica
1. FreeStyle Libre
Consiste em um sensor redondo de 35mm de diâmetro, que deve ser aplicado na face posterior do braço. A aplicação é feita por meio de um aplicador descartável. Cada sensor tem a duração de 14 dias.
O sensor mede a glicemia intersticial a cada 15 minutos, no entanto o sistema depende do paciente para leitura das glicemias. Essa leitura pode ser feita com o leitor específico ou com um smartphone, devendo ser feita no mínimo a cada 8 horas.
Alguns aplicativos do Libre acrescentam ainda outras funções:
- Freestyle Librelink: permite ao paciente checar as glicemias por meio de seu smartphone, podendo adicionar informações sobre alimentação, exercício físico e uso de insulina ao gráfico de glicose;
- LibreLinkUp: possibilita a monitorização das leituras de glicose e setas de tendência por até 20 pessoas — o que pode ser interessante principalmente no tratamento de crianças;
- LibreView: permite acesso pelo médico aos resultados de seus pacientes, incluindo análises e relatórios completos de até 90 dias. Ao permitir esse fácil acesso, os médicos conseguem registrar os resultados em seus próprios prontuários eletrônicos.
Não há necessidade de calibração do sensor, mas seu uso não exclui completamente a necessidade de medir a glicemia capilar.
As principais indicações para medir a glicemia capilar são quando o paciente apresenta sintomas que não são compatíveis com o nível de glicemia detectado pelo sensor, quando ocorrem mudanças rápidas da glicose e para confirmar hipoglicemias.
O médico poderá avaliar as métricas de controle glicêmico de até 90 dias, incluindo o tempo no alvo, porcentagem de hipoglicemias e hiperglicemias, entre outras.
2. Medtronic Enlite e Guardian
São sensores que fazem transmissão dos valores de glicose diretamente para bomba de insulina. A medida da glicose é feita a cada 5 minutos.
Atualmente, no Brasil, temos disponíveis o Medtronic Enlite que se liga ao sistema da MiniMed 640G e MiniMed Veo, e mais recentemente o Medtronic Guardian Sensor 3, que se conecta ao sistema da MiniMed 780G, mas também é compatível com o sistema da MiniMed 640G.
O sensor Enlite precisa ser trocado a cada seis dias e a calibração deve ser feita no mínimo duas vezes ao dia por meio da glicemia capilar. O sensor Guardian 3 deve ser trocado a cada 7 dias e a calibração precisa ser feita 3 a 4 vezes ao dia.
Os dados da bomba de insulina são analisados pelo médico através do software Medtronic CareLink.
3. Medtronic iPro2
Atualmente menos utilizado, pois funciona apenas como uma monitorização retrospectiva. O sensor é utilizado durante seis dias, porém o paciente não tem acesso às glicemias durante o uso.
As glicemias são avaliadas pelo médico após os 6 dias, podendo ajudar no ajuste do esquema de insulina.
4. Miao Miao
Trata-se de um dispositivo que se acopla ao Libre e funciona como um sistema de leitura, transformando o Libre em um sistema de monitoramento contínuo de glicose.
As informações são passadas para wearables como smartphone, smartwatch ou tablet, por meio de um aplicativo que deve ser instalado pelo paciente. Importante que o miao miao não é aprovado pela Anvisa ou pelo FDA, então não há respaldo para o médico prescrever esse dispositivo.
No entanto, muitos pacientes compram por conta própria e importam para o Brasil, sendo importante conhecermos para uso, se necessário.
Análise dos dados
De forma simplificada, para compreendermos os dados, precisamos ter conhecimento sobre o conceito de tempo no alvo e quais as metas do tratamento.
Para a métrica tempo no alvo, considera-se a porcentagem de tempo em que as glicemias estiveram entre 70 a 180, visto que analisamos glicemias pré e pós-prandiais.
Metas para controle do diabetes:
Tempo no alvo > 70%
Hiperglicemias acima de 180 < 25% (sendo menos de 5% de glicemias acima de 250 mg/dl)
Hipoglicemias < 5% (sendo menos de 1% de glicemias abaixo de 54 mg/dl)
Conclusão
Tudo indica é que a tendência é que as tecnologias e dispositivos para monitorização continuem avançando, no sentido de melhorar as métricas de controle do diabetes e prevenindo complicações, cada vez com menor requisição de intervenção pelo paciente e maior autonomia da tecnologia.
Aguardaremos ansiosamente pela chegada de novos avanços para melhorar a qualidade de vida de pacientes que vivem com diabetes.
Referências bibliográficas:
- American Diabetes Association. Standards of medical care in diabetes — Diabetes Care. 2022; 45 (suppl. 1):S97-S112.
- Posicionamento oficial SBD. Monitoramento contínuo da glicose na gestação — nº 01/2021.
- Lin, R. et al. Continuous glucose monitoring: a review of the evidence in type 1 and 2 diabetes mellitus. Diabetic Medicine. 2021;38:e14528.
- Zajdenverg L, Façanha C, Dualib P, Goldbert A, Negrato C, Bertoluci M. Planejamento, metas e monitorização do diabetes durante a gestação. Diretriz Oficial da Sociedade Brasileira de Diabetes (2022).